Local abriga história de amizades e de famílias que superaram o incêndio em 1991 e que sonham em torná-lo ainda melhor para os clientes e turistas.
Na segunda reportagem da série de três para celebrar o aniversário de 167 anos de Juiz de Fora, o G1 conta a história do Mercado Municipal, que se ancora na qualidade dos produtos, na relação de confiança e de amizade entre os clientes e os lojistas. Foram os pilares dele que fizeram o local ressurgir após o incêndio que destruiu o prédio em 1991.
Agora, na contagem regressiva para os 30 anos funcionando no Complexo Bernardo Mascarenhas, no Centro, todos que ali trabalham e convivem assumem que o Mercado é "tudo" em suas vidas e que sonham com dias melhores com a liberação do Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) do Complexo e projetos que valorizem o local.
Conforme informações oficiais, o público consumidor das 23 lojas é estimado em 300 pessoas por dia, gerando receita mensal de R$ 550 mil, incluindo redes de hotéis, restaurantes e bares, inclusive por televendas. Sempre tem que chega pela primeira vez ou quem encontra motivo para visitar todo dia, segundo o supervisor Fernando Antônio da Silva Santos.
"Eles ficam maravilhados porque não imaginam que exista um mercado no coração da cidade com as características do Mercado Municipal. Diversidade de produtos e de estabelecimentos. Também noto que tem muitos consumidores que poderiam fazer a compra semanal, mas gostam de vir diariamente porque se sentem bem vindos e felizes em conversar com os comerciantes", disse.
No segundo piso, funcionam poucas lojas. A maior parte do espaço é ocupada por setores da Secretaria Municipal de Educação. Outras seis lojas estão desocupadas.
Por se tratar de um bem público, a concessão do uso do espaço é feita por meio de licitação. De acordo com a Secretaria de Agropecuária e Abastecimento (SAA), atualmente projetos relativos à gestão do Mercado estão em estudo - o que inclui desde a adequação dos valores cobrados aos atuais concessionários à realização de licitação para interessados em trabalharem lá.
"Estamos elaborando um estudo para ocupar as lojas que estão desocupadas, levar mais qualidade para os produtores que vendem e melhorar o local", disse o gerente de Abastecimento da SAA, Victor de Castro Mattos.
União para ressusgir das cinzas
O mercado público foi inaugurado em 31 de dezembro de 1904 em um prédio na Avenida dos Andradas. Este conjunto arquitetônico foi tombado em 1983 e transferido para a Prefeitura em maio de 1987. Em dezembro do mesmo ano foi remanejado para o Complexo Mascarenhas e inaugurado quatro meses depois, dividindo o prédio com a Pronta Entrega das Fábricas, que funcionava no segundo piso.
Em 12 de setembro de 1991, após um incêndio, o piso do segundo andar caiu sobre o mercado. Apenas as paredes externas permaneceram em pé. Os cerca de 150 comerciantes que ocupavam os 66 boxes do mercado municipal e as 54 lojas da pronta-entrega perderam tudo.
O dono de uma loja de hortifrutigranjeiros, Carlyle Francisco Lopes Barros, recorda que não acreditou quando soube da notícia durante compras na Central de Abastecimento de Minas Gerais (Ceasa) .
“Alguém me avisou que não era para comprar nada porque o Mercado pegou fogo. Quando cheguei no Manoel Honório olhei para o Centro e vi aquela fumaça no céu, pensei comigo ‘o negócio foi feio. Acabou tudo’. Na época não tinha a Praça Antônio Carlos, ali era um contorno e o pessoal que trabalhava com a gente, os amigos estavam todos sentados, chorando. Fiquei ali perdido no meio deles. Foi uma tristeza. Não tenho palavras para falar o que aconteceu”, lembrou.
Os laços entre lojistas e boxistas ajudaram a superar o incêndio, como lembrou o atual o secretário adjunto de Governo, Paulo Gutierrez, que na época era presidente da Associação da Pronta Entrega das Fábricas.
“Unimos a comissão do Mercado com a associação para bancar a reconstrução. Fornecemos todo o material e o local foi reaberto em 1995. Tivemos que buscar força onde não teria para reverter e reconstruir o que tinha perdido. Conscientizar diferentes setores que ali era o nosso ganha pão. Nós criamos, o incêndio destruiu e vimos ressurgir das cinzas”, recordou.
O dono de uma loja de hortifrutigranjeiros Carlyle Francisco Lopes Barros também considerou a união fundamental enquanto ocupavam o prédio ao lado do imóvel destruído, onde atualmente é Secretaria Municipal de Educação.
“A força do Mercado está nas pessoas. Foi um ajudando o outro. Todos perdemos tudo. Era um depósito, limpamos, pintamos e ficamos ali num aperto, muito pequenininho, atendendo. Não tinha estacionamento direito, para chegar até onde a gente estava trabalhando era difícil, mas os fregueses não largaram a gente hora nenhuma”, explicou.
Enquanto isso, a pronta-entrega funcionou na antiga área de carga e descarga do Mercado Municipal. “Foi um momento de uma dificuldade muito grande, não deixamos as pessoas perderem a esperança daquele sonho e a importância que representava para a malharias de Juiz de Fora. E mesmo de forma precária, ainda recebia de 70 a 100 ônibus de outras cidades por semana”, lembrou Gutierrez.
'Uma vida aqui dentro'
Todos os dias Carlyle Francisco Lopes Barros repete a rotina desde que foi um dos primeiros a chegar ao Mercado. E ele já foi presidente e vice da associação dos lojistas. Agora, é um dos pioneiros e referência na venda de alimentos orgânicos na cidade.
“Quando comecei, não havia nada disso. Pesquisando mais produtos de uns três anos para cá, entrei nesta parte que está crescendo muito. A única dificuldade é adquirir. Eu compro de produtores de Piau (MG), Itaipava (RJ), Petrópolis (RJ) e de São Paulo (SP). A gente pega um pouquinho de cada um. Acredito que em cinco anos, vai estar melhor e maior”, afirmou.
Uma das informações que os visitantes recebem é que se estiver procurando condimentos ou temperos e não encontrarem no Mercado Municipal, dificilmente conseguirá em outro lugar da cidade. O motivo passa pelo trabalho de Luiz Carlos Pinto, o Luizinho, o dono da loja de temperos, condimentos e especiarias "Não vai achar não. Tem que pesquisar para encontrar. Em São Paulo, em algum lugar tem que ter. Sempre os clientes dão sugestão e também me dão uma mão", disse.
No local desde o início, é direto ao definir a importância para ele: "O Mercado representa tudo, a formação dos meus três filhos, minha vida inteira. Eu vim da feira livre, na época, a preferência foi para os feirantes e produtores. Os clientes vieram para cá e continuam até hoje", comentou.
No dia que a reportagem do G1 visitou o Mercado, encontrou o motoboy Rosinei Martins, um dos três que prestam serviços para os boxistas. "Os lojistas pegaram confiança e eu faço serviço de entrega e de banco. Não só entrega de frutas e documentos. Tudo que precisa de um motoboy. Tem que ter responsabilidade com prazo para cumprir e fruta que não pode estragar", comentou.
Confira no vídeo abaixo como o comerciante Carlyle Francisco Lopes Barros; o atual presidente da Associação dos Concessionários e Permissionários, Welder Lessa Freitas de Carvalho e o proprietário do Bar da Fábrica Waney Santos Rocha definiram a importância do Mercado Municipal na vida deles.
Muitas pessoas que frequentam o Bar da Fábrica provavelmente não sabem que antes ele foi peixaria e só assumiu o atual formato de bar, restaurante e casa de espetáculo em 2004. Atualmente, Waney Santos Rocha tem a companhia das filhas na gestão.
“Hoje eu trabalho menos, supervisiono, porque elas são responsáveis por tocar o bar. Uma é chefe de cozinha responsável pela parte de alimentação e bebidas; outra faz a parte de contratação de negócios e a outra faz a administração e gerenciamento da casa. E isso ocorre com os outros comerciantes”, resumiu.
O presidente da Associação dos Concessionários e Permissionários, Welder Lessa Freitas de Carvalho, disse que o trabalho é para honrar a história do local. "Estamos juntos com a Prefeitura em um trabalho para melhorar cada dia, para ver se fica como a gente quer", comentou.
O secretário adjunto de Governo, Paulo Gutierrez, explicou a importância do funcionamento da Pronta Entrega das Fábricas no local. “Antes houve uma feira na rodoviária, então fizemos a proposta, que foi aceita, de montar a pronta-entrega na parte de cima do Mercado e funcionou lá de 1988 a 1991. Era algo importante para consolidar ainda mais o nosso setor na cidade”, explicou.
No entanto, Gutierrez considera que o cenário não favorece o retorno da pronta-entrega das fábricas. “Com a abertura de exportação, a concorrência de produtos asiáticos foi cruel e as confecções nacionais foram atingidas. Juiz de Fora perdeu malharias e atualmente tem dois shoppings com melhor infraestrutura para atender aos consumidores. Uma opção que ainda precisa ser estudada é usar o espaço como um centro de pequenas feiras”, explicou.
Na visão dele, a revitalização da área central e até mesmo a programação voltada para homenagear Bernardo Mascarenhas podem impactar de forma positiva. “O Mercado é um ponto importante de referência da cidade e temos projetos de revitalização da região. Teremos neste ano programação pelos 170 anos de nascimento de Bernardo Mascarenhas. Até novembro, vamos recordar que foi um pioneiro da tecelagem, industrial ousado responsável pela construção da Usina de Marmelos. Os mais jovens precisam conhecer esta história. Ao mostrar o que ele fez, valorizamos todo o complexo, incluindo o Mercado”, afirmou.
O dono do Bar da Fábrica Waney Santos Rocha destacou que o Mercado Municipal tem ainda muita história pela frente. “A gente está caminhando. Está com 20 e poucos anos, ainda falta para chegar a mercados que são reconhecidos até internacionalmente como o mercadão de São Paulo, Florianópolis, o de Belo Horizonte, onde os associados entraram em processo licitatório e compraram o prédio e administram o mercado”, disse.
Mirando no exemplo do mercado da capital, Waney Santos Rocha sonha com uma relação menos dependente da Prefeitura. “Eu sonho que a administração possa ser gerida não pelas pessoas que passam, mas por nós que estamos e somos o mercado. Temos muitos espaços ociosos, muitas lojas e boxes vazios há anos. Mas tem que cumprir a lei e tem que ser licitada. Seria muito mais fácil se hoje a gente não dependesse tanto da Prefeitura, tivesse poder de como direcionar porque a gente tem a capacidade para isso”, analisou.
Outra pendência que está com a solução em andamento é conseguir o Auto de Vistoria do Corpo de Bombeiros (AVCB) do Complexo. A demanda surgiu a partir da interdição do Bar da Fábrica, em 2015. “A gente tinha algumas irregularidades e já adequamos a situação. No entanto, a liberação não é apenas para um ou outro comerciante, depende de todo o complexo estar sanado e estamos aguardando a resposta do Corpo de Bombeiros”, contou Waney Santos Rocha.
Em nota, o 4º Batalhão de Bombeiros Militares informou que em novembro de 2015 foi firmado um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para que as irregularidades no Bar da Fábrica fossem sanadas. E que o Processo de Segurança Contra Incêndio e Pânico do Centro Cultural Bernardo Mascarenhas está em fase de tramitação para aprovação.
“O projeto contempla uma área de 8.505,90 metros quadrados, que abrange as edificações do Centro Cultural Bernardo Mascarenhas, Biblioteca Municipal Murilo Mendes, Secretaria de Educação, Mercado Municipal e Bar e Restaurante da Fábrica. Pelo fato da edificação ser composta por várias ocupações, as quais não configuram o risco isolado, é necessária a confecção de um projeto único, o qual deve contemplar toda a área da edificação”, informou o texto.
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