quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Deputado teria usado verba para pagar empresa com endereço inexistente

Empresa funcionaria em imóvel em Santana, no Amapá (Foto: Abinoan Santiago/G1)Empresa funcionaria em imóvel em Santana, no Amapá (Foto: Abinoan Santiago/G1)

O endereço de uma casa na Avenida das Nações, no Centro de Santana, a 17 quilômetros de Macapá, foi usado para movimentar mais de R$ 500 mil por um deputado estadual por quase dois anos, sem que o dono do imóvel soubesse.

A localização é a mesma da Braz Serviços, que, na Receita Federal, é cadastrada como impressora de livros e locadora de veículos. Ela recebeu dinheiro através de verba indenizatória do deputado estadual Kaká Barbosa (PT do B), que vai assumir a presidência da Assembleia Legislativa do Amapá (Alap) no retorno do recesso parlamentar, em fevereiro.

O G1 fez contato por dois dias com a assessoria de comunicação do deputado, que prometeu enviar uma nota sobre o assunto, mas, até esta publicação, nenhuma resposta havia sido dada.

Conforme confirmam documentos, de fevereiro de 2013 a janeiro de 2015 a empresa Braz Serviços recebeu o montante de R$ 569.736 por ter locado uma picape e uma van ao deputado Kaká Barbosa. O pagamento iniciou com R$ 24.219 por mês, depois foi reduzido para R$ 22.019 e terminou com R$ 31.137. Até esta publicação, o dono da empresa não havia sido localizado para falar sobre o assunto.

Na Receita Federal, o empreendimento aparece com o capital de R$ 20 mil e endereço na Avenida das Nações, número 1309, no bairro Central, em Santana. O G1 foi até o local e lá mora apenas a família do funcionário público Sérgio Roberto, que preferiu não ser fotografado, mas aceitou gravar entrevista.

Kaká Barbosa, deputado estadual, Amapá (Foto: Divulgação/Decom/Alap)Kaká Barbosa, deputado estadual do
Amapá (Foto: Divulgação/Decom/Alap)

Ele disse que nunca constituiu empresa ou adquiriu caminhonete ou van. Apenas uma motocicleta encontrava-se na garagem.

"Sou funcionário público. Nunca construí nenhum negócio, ainda mais empresa. Estou na prefeitura de Santana há 13 anos através de concurso. Nunca ouvi falar nessa empresa, ainda mais com o meu endereço. Alguém usou a minha casa para fazer alguma jogada", disse, assustado, após confirmar que os dados fornecidos pela locadora de veículos à Receita são o mesmo da casa dele, onde diz morar desde criança.

O primeiro pagamento feito para a Braz Serviços foi em fevereiro de 2013, um mês depois do último depósito efetuado à empresa antecessora, a E.Q. Silva, empresa fantasma, segundo o Ministério Público (MP), que teria recebido R$ 186 mil sem alugar carros para o deputado Kaká Barbosa. A denúncia relacionada a este caso é de dezembro de 2015.

A E.Q. Silva foi aberta em 10 de novembro de 2011, em nome de Edileuson Quintela da Silva. Foram firmados 17 contratos com a prestadora, sendo que 14 depois da morte do suposto proprietário. Ele foi encontrado com marcas de estrangulamento em 14 de dezembro do mesmo ano, em Santana. O caso, à época, foi mostrado com exclusividade pelo G1 e resultou no bloqueio dos bens de Kaká Barbosa.

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De acordo com o regimento da Assembleia Legislativa, cada deputado tem livre escolha para decidir qual empresa vai fornecer serviços para o gabinete. O contrato é firmado entre o prestador e o político. Ao receber o serviço, cada parlamentar paga à empresa e pede o reembolso da Assembleia através de nota fiscal. Atualmente, o valor para verba indenizatória está em R$ 32.252,19.

Consultado, o Ministério Público avaliou que a continuidade de supostas práticas delitivas por deputados já denunciados na Assembleia Legislativa não surpreende os investigadores.

"Poderia surpreender se fosse uma pessoa processada por um crime e voltasse a repetir algo semelhante, mas devido o nosso cotidiano, nada mais nos surpreende. De certa forma, essa prática deixa o Ministério Público preocupado porque quando se investiga e denuncia, entendemos que isso seria uma maneira pedagógica do que fez para não voltar a fazer o que fez", comentou o promotor de Defesa do Patrimônio Público Afonso Guimarães, que denunciou civilmente o deputado Kaká Barbosa no caso dos contratos assinados com um morto.

Prestação de serviços
Após encerrar os pagamentos à empresa de Santana, o deputado Kaká Barbosa passou a alugar carros em Macapá. O primeiro contrato foi com a Engepre, que, na Receita Federal, tem como única atividade a construção de artefatos de cimento.

O G1 localizou um dos donos do empreendimento. Ele confirmou que manteve contrato com o gabinete do deputado por dois meses ao preço de R$ 8,1 mil, em 2016.

Além disso, em junho, julho e agosto de 2016, foram contratadas locação de impressoras e office boy pelo valor mensal de R$ 21 mil de uma empresa que também não tinha os referidos serviços na descrição informada à Receita Federal.

Para o promotor de Justiça Afonso Guimarães, a falta de descrição na Receita Federal dos serviços pode indicar alguns indícios de falta da prestação do contrato. Ele, no entanto, ressaltou que o caso requer investigação mais aprofundada por parte do MP em caso de abertura de um inquérito.

"É um indício de que não houve prestação o fato de a descrição não estar no hall da empresa. Se ela foi criada para oferecer um tipo de serviço, como é que faz outro? Teríamos que apurar mais a fundo", avaliou.

Empresa tem mesmo endereço de residência em Santana (Foto: Reprodução)Empresa tem mesmo endereço de residência em Santana (Foto: Reprodução)
Kaká Barbosa (Foto: Reprodução)Kaká Barbosa firmou contrato com empresa em Santana (Foto: Reprodução)

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